
Batman não tem super-poderes, nunca os teve como o Homem-Aranha e o Super-Homem os têm!
Nelson Pascarelli Filho
Batman não tem super poderes, nunca os teve como o Homem-Aranha e o Super-Homem os têm.
Batman é o herdeiro único de uma fortuna que o possibilitou compensar a ausência de super-dons físicos investindo em alta tecnologia.
A perda dos seus pais não foi re-significada através de um gradativo crescimento psíquico, mas na busca de justiça que se confunde com
vingança.
A alta tecnologia está na Bat-Caverna, no Bat-Móvel e numa Bat-Roupa que lhe dá proteção contra o fogo, tiros, quedas e o permite pular de grandes alturas e até mesmo voar! Há também o Bat-Cinto, talvez inspirado no velho canivete suíço Victorinox.
Batman é triste, soturno, vampiresco, afetivamente embotado, imprevisível e violento, apesar de toda tecnologia que carrega em suas vestes indestrutíveis, ela não o faz menos triste.
Batman surgiu em maio de 1939 na revista norte-americana Detective Comics.
A Segunda Guerra Mundial, que durou de primeiro de Setembro de 1939 até dois de setembro de 1945, aperfeiçoou e transformou a personagem Batman e criou outros tantos super-heróis que serviram à ideologia etnocêntrica do povo norte-americano.
Quem domina a Tecnologia conquista o mundo e também rege os ditames da moda. Assim foi
com os ingleses, que por séculos dominaram a tecnologia naval e assim é com os EUA que dominam a tecnologia atômica.
As sociedades americana e inglesa são culturas herdeiras de si mesmas que não veem o “outro pelo outro”, mas julgam as demais culturas mensurando-as pelo quanto se aproximam ou se afastam do seu modo de vida – The American Life.
Ignorando o relativismo cultural, elas impõem para o mundo globalizado, através de um marketing agressivo e um capitalismo bélico selvagem, seus valores etnocêntricos.
Batman traz arraigado a sua roupa toda tecnologia bélica que nos remete simbolicamente à cultura americana. Cultura etnocêntrica que impõe aos demais povos o seu modelo democrático pela guerra.
Os EUA, que são a maior potência econômica mundial e têm o maior número de prêmios Nobel, possuem também as maiores populações carcerárias e psiquiátricas do mundo, por quê? Qual é o custo psíquico para uma sociedade que é regida pelo slogan “tempo é dinheiro”?
A postura ética implica no exercício de ver o “outro pelo outro” e não julgar o outro pelas lentes de sua cultura – é um difícil exercício de relativismo cultural e alteridade que se opõe à toda impregnação ideológica.
Gotham City é dark e underground, uma cidade doente que lembra Chicago dos anos trintas, dominada pela Máfia Italiana.
Gotham City necessita de heróis para viver sem medo, mas o terror está sempre latente, porque dos bueiros e das frestas de Gotham City surgem inimigos com habilidades destrutivas surpreendentes: Coringa, Charada, Chapeleiro Louco e Sr. Frio. Todos tão psicóticos e sem super poderes como Batman, mas hábeis em destruir.
O etnocentrismo do herói é a força-motriz para destruí-los, porque são diferentes, maus e incorrigíveis e não podem habitar pacificamente Gotham City.
Segundo Guimarães Rocha[1], Etnocentrismo é uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência. No plano intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como sentimentos de estranheza, medo, hostilidade, etc.
Tanto na série televisiva dos anos sessenta e setenta, como nos filmes para o cinema, o herói Batman transmuta-se em vestimentas de morcego elegante e seus inimigos usam roupas excêntricas que os ridicularizam. Os inimigos de Batman simbolizam em suas vestes e trejeitos o mal que os caracteriza.
É assim que uma cultura etnocêntrica vê e julga a outra: de forma bizarra, selvagem e sempre kitsch! A sua missão é convertê-la, ou, na impossibilidade de conversão, destruí-la através dos refinados métodos da poderosa tecnologia bélica que possui e da constante aniquilação de suas tradições culturais milenares.
E foi isso que os norte-americanos fizeram com os índios, esquimós e estão fazendo no Iraque e Afeganistão, impondo um modelo democrático e etnocêntrico pela guerra contínua.
Talvez os norte-americanos alimentem a esperança de que um dia o mundo islâmico use calça jeans, camiseta branca e tênis.
Talvez seja bem mais do que isto, visto que a cultura islâmica também é etnocêntrica, por isso que no choque bélico de duas culturas etnocêntricas surge a guerra sem fim, principalmente quando se perde o medo da morte e quando é prometido ao guerreiro que morre por uma causa religiosa galardão na eternidade.
Os EUA por muito tempo esqueceram-se dos chineses, outra cultura etnocêntrica que a cada dia conquista o mercado globalizado, mas os chineses não são regidos pelo espírito vampiresco de Batman, talvez eles ainda tenham em latência o fantasma de Mao Tse Tung.
Há uma esperança de que num futuro próximo o país que dominar a tecnologia da reciclagem domine o mundo, porém, que seja uma dominação destituída de valores etnocêntricos e repleta de valores ambientais, sem “ecoterrorismo”.
Seria mais interessante viver num mundo assim, onde os super-heróis usassem roupas feitas de fibras naturais de rápida decomposição com tecnologia que sequestrasse o dióxido de carbono e emitissem raios éticos sobre seus inimigos colocando-os na postura de “ver o outro pelo outro” e não por si mesmos.
Que nomes poderíamos dar para esses super-heróis socialmente responsáveis?
[1] O que é etnocentrismo. São Paulo: Brasiliense, 1999. Col. Primeiros Passos.
Sobre o autor:
Nelson Pascarelli Filho é consultor científico-educacional, palestrante e escritor
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