
Homem dedicado. Nunca trocava seu trabalho, horas de grande produção, por momentos de lazer. Assim dizia, quando alguém o convidava para um passeio, um banho de mar, ou até um jogo de dominó:
— Vou nada! Vou deixar meu trabalho de lado pra me encher de sal na praia? Banho, tomo em casa.
Seu nome era João, mas os colegas, na ausência, o chamava de Fiel. Dedicação tinha para toda hora. Não faltava um dia na empresa. Sábado, domingo, feriado era com ele mesmo. O patrão não se preocupava em negociar dia com nenhum outro funcionário. Mesmo sem ser convidado, estava rente no serviço. E a grana? Dessa, não abria mão. Ficava muito mais sério, quando surgia algum comentário referente a esse assunto. Sempre fora honesto e responsável. Todos naquele setor de trabalho sabiam que o fiel trabalhador, como era conhecido, também exigia fidelidade na hora de receber o pagamento.
— João, não entendo pra que você quer tanto dinheiro. Não vejo luxando nem comprando o que gosta. Nunca o vi nem mesmo num restaurante. O que vai fazer com tanta grana? – Antes que terminasse seu discurso, o colega de área foi interrompido:
— Pare aí, rapaz! Você sabe mais da minha vida do que eu?! Também não posso nem guardar meu dinheiro? O povo aqui deixa de cuidar da própria vida para se ocupar com a vida alheia. Já gostam de tomar conta da minha semana.
O pobre trabalhador, pobre não, Fiel, já estava saturado porque falavam demais sobre a sua saúde e sua família. Quase todo mundo vivia com sua vida na boca. Parecia mesmo que ninguém tinha mais o que fazer. Só ele.
— Desculpe, meu amigo. As pessoas aqui não querem o seu mal. Pelo contrário, se preocupam com você. Até uma consulta médica, você não marca.
João já estava vermelho. Você imagina por quê?
— Cara, está querendo insinuar alguma coisa? Não estou doente não, viu?! E vamos parar por aqui! – Saiu resmungando, com muita raiva. Naquele dia, quase comete uma falha. Havia pensado em socar o companheiro. “Onde já se viu?! Querer que eu fique doente só pra tomar o meu lugar !” –Assim ficou a pensar durante o resto do dia. E não mais se dirigiu àquele homem invejoso. Só pretendia falar com ele na manhã seguinte, ao chegar à empresa.
— Bom dia a todos! Nosso patrão está muito triste. E por isso precisa conversar com todos vocês. Tem um importante pronunciamento a fazer. –Informou o subgerente, utilizando um megafone.
Depois dessa fala, todos, de os olhos ficaram arregalados, ficaram surpresos e temerosos.
— Bom dia, pessoal! Hoje é um dia de extremo pesar para mim, para a empresa e para todos que aqui se encontram. Perdi parte da minha empresa, um pedação de mim…
Teve que parar de falar. Um grande alvoroço se formou. Os funcionários começaram a se desesperar. Pensaram que a empresa estava falida. E mais: além da demissão em massa, ninguém receberia um tostão sequer. E que tempo de serviço que nada! Quanto mais pensavam mais enlouquecidos ficavam. Foi grito e choro para todo lado. Quase que o patrão não conseguira o controle da situação novamente.
Com o megafone, falando bem alto, ele retomou o discurso e buscou amenizar a situação.
— Gente, calma! Não haverá demissão nenhuma! Vocês parem e escutem o que vou dizer! Agora!!!
Todos pararam, atordoados, sem entenderem o que acontecia.
— Precisamos ter muita calma e ouvir com atenção. Estou em prantos pela perda de Fiel. Ele teve um enfarto e faleceu quando saía de casa para vir trabalhar. Estou declarando três dias de luto nesta empresa, pela sua memória. Depois disso, vamos seguir a vida. –Entregou o microfone ao subgerente.
— A vaga de Fiel já está à disposição. Faremos uma nova contratação. Quem quiser indicar alguém procurem o setor de pessoal.
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