
Uma casca de banana sobre a mesa e abafador de ruídos
Uma casca de banana sobre a mesa, uma xícara de café sem café, o tapetinho gasto do mouse também gasto, os óculos sujos nos olhos igualmente sujos, cabelos desgrenhados, um livro aparece diante de nós para dizer-se estado ao vento. Uma quase resposta diante do que anda a acontecer mundo afora: os clássicos todos às vezes perdem o sentido. Por mais que apertemos o F5, a página recarregada, as notícias são as mesmas. De nada adianta tamborilar os dedos no tampo da mesa, isso nunca muda. Lá fora, guerra — tanto a prática comum e violenta quanto a estética, a imposta, o orgulho do mais forte. Cá dentro, o autismo.
Há como fugir disso? Há regras? Cadê o mapa, afinal, para nele nos guiarmos? Quem pudera pudéssemos saber, de antemão, do que acontecerá mais adiante, sei lá, pelo menos nas próximas 24 horas — teoricamente teríamos tempo para decidir o que fazer, para quando fazer, termos condições de melhorar (ou adequar as respostas ao que nos é pedido). Na impossibilidade, temos de mascarar nossas atitudes, nossos anseios, até mesmo — menos eventualmente e mais frequente — deixar de lado nossos sonhos só para viver. Viver num mundo caótico. O caos é bom, na verdade, o caos é bom, mas numa determinada medida; quando ultrapassado, perde-se o controle.
Teoricamente.
O cursor do editor de texto pisca diante de nós, como um aviso: eu sou ameaça, uma ameaça para quem nada digita em mim. Não dá para fazer uma correlação com a folha de papel cuspida pela impressora (o que tem nela escrito? Uma história de amor? Uma história de terror? Uma história, apenas?) — juro que ouço, agora agorinha, o barulho dela, engasgando por conta da grossura do papel, da espessura da impressão, da quantidade de palavras que fora obrigada a jogar fora, juro jurado juradinho! — ou ainda com a vida alheia: pensa no erro cometido! Esse cursor do editor de texto que pisca diante de nós, é a nossa própria vida. O nosso amanhã. O nosso agora que fica para trás, e outro agora, mais um, até formar nossos oitenta e oito anos três meses e quarenta e quatro horas da vida que vivemos. É o estertor final, também, lá longe, mas um longe perto.
Então então?
Vamos lá, me acompanhe, respire comigo, inspira, segura o ar oito segundos, isso, expira. Remédio para o autismo é viver, e viver da melhor maneira possível, tendo de nos adaptar ao ambiente (forçar um pouco ao mundo neurotípico adaptar-se a nós, também), pois para parte de nossas crises há alguns remédios, escritalopram, ansitec, ritmoneuram, até mesmo sorrisos forçados. Ah, não podemos esquecer do abafador de ruídos, pois sim?
Espera um instante, vou colocar a casca de banana no lixo.
Pronto, voltei. Voltei e pensei: tá na hora de beber água.
Estendo, portanto, o desejo a ti: hidrate-se.
E leia. Leia muito. Leia sempre. A seu tempo.
Nas esquinas do corpo tudo é instável.

Faça um comentário