
Samille Ornelas tem 31 anos e havia sido aprovada no Sisu para estudar medicina na Universidade Federal Fluminense. Comitê de heteroidentificação e Justiça afirmam que ela não tem ‘características fenotípicas’ de parda.
“Sou uma mulher negra, vim de família simples, nasci no interior da Bahia. . Estudei sozinha durante
anos, apenas auxílio das aulas YouTube, conciliando minha preparação com longas
jornadas de trabalho em regime de 12×36 horas. Aproveitava todo o tempo livre – nos
intervalos do almoço, nas madrugadas e folgas — para estudar.”

Saiba mais sobre o caso
Samille fez o Enem 12 vezes e se dedicou a Medicina a partir de 2019. Em 2024, foi aprovada em Medicina na Universidade Federal Fluminense (UFF). A jovem parda não foi considerada e não pôde fazer a matrícula. Segundo a instituição, ela não teria as características fenotípicas esperadas.
“Fiquei revoltada, indignada, muito triste e decepcionada. Eu tinha certeza que ia dar tudo certo na justiça, porque não tinha como questionar o óbvio. Fui surpreendida com a negativa do desembargador falando que as minhas fotos não provavam. Se as minhas fotos não provam quem eu sou, eles não me veem pessoalmente, como eu vou provar, então?”, afirma a aluna.
O juiz de segunda instância ignorou completamente as provas apresentadas — fotos,
laudo, documentos — e afirmou que não vestiria a camisa do caso, independente das
provas, fotos e fatos apresentados, mantendo a decisão da banca sem
aprofundamento. Sem qualquer aviso prévio ou direito à defesa, a matrícula de Samille foi
cancelada de forma imediata, e todos os seus acessos ao sistema da UFF foram
bloqueados. “Só descobri o que estava acontecendo quando fui impedida de entrar no
restaurante universitário junto aos meus colegas, me constrangendo e me deixando
completamente paralisada e, mais uma vez, invalidada.”
Samille disse ao Jornal Atípico que espera que a UFF reconheça o erro e que ativem a matrícula de volta independente da justiça.
“Queria dizer que estou grata pela sensibilidade que todos tiveram com meu caso. É um momento de extrema fragilidade. Quero deixar claro que eu acredito na importância das bancas e em momento algum quero fragilizar elas. Eu sou sim uma mulher negra e o que houve foi um erro que precisam reconhecer. Quero que quem veja o meu caso, possa enxergá-lo com humanidade e que me ajudem a dar voz a essa pauta importante, com o intuito de debate e não de retrocesso para que o mesmo não aconteça com mais pessoas. As bancas são necessárias para garantir nossa reparação histórica e não podemos deixar que o meu caso, mesmo cheio de dor, descredibilize a importância histórica da conquista das bancas de heteroidentificação.”
O que disse a UFF
Nota Oficial caso Samille Ornelas
A Universidade Federal Fluminense (UFF) esclarece que o caso envolvendo a candidata Samille Ornelas está atualmente sob a esfera judicial, e que a instituição cumpre integralmente as decisões emanadas pelo Poder Judiciário, sem interferência ou autonomia decisória neste estágio do processo.
Ressalta-se que a candidata foi considerada inapta por duas comissões independentes e distintas, compostas por servidores e estudantes que recebem, regularmente, formação conduzida por especialistas na área dos estudos étnico-raciais. Portanto, são membros capacitados para atuar nas avaliações, com formação específica em letramento racial.
A UFF acredita firmemente na relevância das políticas de reserva de vagas para ingresso no ensino superior e tem atuado de forma contínua em sua implementação e aperfeiçoamento, com base nos princípios da justiça, diversidade e compromisso com a função social da universidade pública. A instituição busca assegurar, com máxima responsabilidade, que seus processos seletivos sejam conduzidos de forma transparente, isonômica e em conformidade com a legislação vigente.
O Jornal Atípico presta a sua solidariedade a Samille Ornelas.
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