Você já viu aquele amigo que tenta ser a voz da razão num grupo de WhatsApp? Não o que manda áudios de 20 minutos sobre política, mas aquele que, ao menor sinal de tempestade ideológica, começa a se afastar como uma barata quando a luz acende. Pois bem, dias atrás, fui esse amigo — ou pelo menos tentei.
Tudo começou com uma figurinha. Não era sobre novela, nem o cachorro fofinho do vizinho. Era um daqueles GIFs “politicamente carregados”, com frames capazes de provocar um impeachment por segundo. Eu, que sou um ser de paz e não me envolvo em engajamento fervoroso, fui lá e postei a dita figurinha, achando que todos fariam o mesmo: dar risada e seguir em frente. Ingenuidade minha. Em minutos, o que se seguiu foi um pequeno apocalipse digital. (E nem era sobre o incêndio na Amazônia, imagine a revolução ideológica que veio depois!)
Churrasco Político e Reputações Assadas
O que se seguiu foi um apocalipse digital. Emojis viraram granadas ideológicas. Cada figurinha, uma tentativa de golpe retórico. E eu, que só queria um café em paz, me vi no meio de um churrasco político onde, em vez de carne, estava prestes a ter minha reputação virtualmente assada.
No fundo, o que percebi, ou melhor, o que se tornou claro, é que, com tantas opções políticas, não importa se o Brasil tem trinta ou trinta mil partidos. O curral eleitoral segue firme — só que agora com Wi-Fi. Sai o cercado físico, entram os chats, os memes e emojis para fazer a captação de votos. E, entre um gif e outro, eu só pensava: “Quem diria que, em pleno século 21, o verdadeiro rebanho seria guiado por uma figurinha no WhatsApp?”.
À medida que os minutos passavam, a batalha começou a tomar proporções épicas, dignas de uma guerra que não envolvia tanques nem soldados, mas gifs e figurinhas que competiam pelo posto de “comentário mais incendiário”. A troca de farpas foi imediata, o que acontecia ali era um festival de rótulos e acusações. Lulista, bolsonarista, esquerdista, direitista… um verdadeiro desfile de “-ista” que não leva ninguém a lugar algum, a não ser ao fundo do poço da chatice.
Polarização 2.0: Coronéis Digitais e o Rebanho De Dedos
O curioso é que, com tantas opções de partidos, ideologias e posições, parecia que, no fundo, todos ali estavam seguindo o mesmo script. Eu comecei a imaginar que o verdadeiro papel da tecnologia, ao invés de facilitar o debate e a troca de ideias, estava se tornando o grande culpado pela polarização 2.0. Como se cada notificação fosse uma nova dose de adrenalina para o cérebro politicamente excitado. E o pior: ninguém se atrevia a dar o primeiro passo para a desescalada. Não, porque o “primeiro a ceder” numa discussão de WhatsApp seria lembrado, mais tarde, com uma referência maldosa como: “Aquele que se deixou corromper pela agenda do inimigo.” E eu, no meu papel de observador atônito, pensava: “Uau, como a política evoluiu…”
Mas evoluiu mesmo? O velho curral eleitoral, com seus favores e cabrestos, agora veste terno digital. Os coronéis de outrora foram substituídos por estrategistas de meme. E o rebanho? Bem, esse desliza o dedo na tela, buscando figurinhas e se guiando por indignações superficiais.
O Novo Curral: Bites, Dedos e Rancor
E lá estava ele, o extremismo surdo pronto para defender sua bandeira — uma
pedra virtual em cada mão — como se fosse possível convencer alguém a mudar de opinião via emoji de desprezo. A virtualização das opiniões, em vez de aumentar a troca de ideias, só servia para aumentar o volume da aversão e do preconceito ideológico. E eu, rindo de nervoso, só podia pensar: “Meu Deus, em que momento as discussões sobre política se transformaram em um reality show de emojis e textos corrigidos automaticamente?” Foi então que, após algumas ameaças, um ou outro comentário sobre os
“inimigos da pátria” e uma avalanche de “apoios velados”, chegou a parte final da minha reflexão: o grande “curral eleitoral” não estava mais nos grotões do Brasil, com a velha prática de favores em troca de votos, mas se encontrava ali, em alguns bites de tela, no deslizar frenético de dedos, nas trocas de figurinhas e nos memes que disfarçam discursos rancorosos.
Essa polarização, que parecia um monstro em pleno crescimento, só poderia ter uma explicação. O “curral eleitoral 2.0” é dominado pela tecnologia, onde o voto, antes reservado às urnas, agora se revela em “likes” e “shares”. E a indignação, que antes era algo mais profundo, passava a ser apenas mais um item para ser consumido e descartado, como uma propaganda de margarina na TV.
A Morte do Debate Inteligente
Afinal, a questão nunca foi o número de partidos. Não. O problema era a mentalidade do eleitorado, que se deixava seduzir não pela ideia, mas pela paixão cega de uma narrativa vendida a preço de ouro.
E o pior? Todo mundo ali, em algum momento, foi culpado disso. Eu, incluindo. Quem nunca se deixou levar por uma indignação superficial? Quem nunca se absteve de ir um pouco mais fundo na reflexão só porque o “inimigo” estava ali, com a sua mensagem em maiúsculas, pronto para te atacar?
A ironia, claro, estava em que o tal “curral eleitoral” de outrora, tão criticado pelos mais Cínicos, hoje se via tão moderno, tão refinado. Que maravilha a evolução da política, não? Agora, o rebanho é digital, e seus pastores, bem, esses só precisam de uma boa estratégia de meme para garantir o controle dos extremos, cada gado no seu canto. E assim, entre uma figurinha e outra, percebi o seguinte: se o futuro da democracia está sendo guiado por emojis e discussões superficiais, temo que o maior risco não seja o desaparecimento das urnas, mas a morte do debate inteligente, aquele que nos faz pensar e não apenas reagir como robôs programados. O verdadeiro problema, meus amigos, é que até o humor ácido está ficando obsoleto — agora, ele é apenas uma piada de WhatsApp, reprimida sem a menor
reflexão.
Eu, claro, segui o caminho que pensei ser o mais sábio; chamei a pessoa no particular e encerrei a discussão longe dos holofotes digitais, fui tomado por uma sensação de vitória — não sobre os outros, mas sobre minha sanidade. No fim, isso é o que importa. Pelo menos até o próximo GIF.

